Um texto antigo


Aqui, o termo protagonista, de fato, não pode ser aplicado sem ressalvas. Embora queira estar à dianteira o tempo todo, as minhas inclinações mais instintivas levam-me a outra direção. A despeito de toda dedicação e amor que me perpetram, sou, na maioria das vezes, incapaz.

Juro e confesso, estas são minhas palavras.

Eu não consigo mais me debater sobre a superfície rasa. Eu tenho deixado o tempo fazer seu papel natural, sem me preocupar, ou - talvez não seja preocupar a palavra certa - ignorando. Acontece que mesmo que eu ignore, ainda permanecem espinhos que estão incrustados muito abaixo da pele. A isso tudo somam-se erros que ainda não passaram para aquele estágio que dizemos “...isso no final foi bom, pois aprendi e cresci bastante”. Afinal, não devo ser mesmo desse tipo de pessoa que aprende com os erros, e ainda não me deparei com alguém que pudesse tirar mais proveito disso do que dor e talvez não seja esse o propósito, enfim. Eu observo, de longe, as pessoas a dizerem, deliberadamente, o quanto foi bom ter acontecido aquilo para ela, o quanto ela aprendeu, o quanto isso ou aquilo, mas é balela. Dizem isso para esconder a dor, para diminuí-la. Repetem tantas vezes que chegam a acreditar. Isso sim eu tenho apreendido com veemência; os truques e as artimanhas que mentes fracas utilizam para continuar a enfrentar o mundo. Acho mesmo que eu invejo essas capacidades. Tem muito mais coragem nisto do que outra coisa.

Eu, agora, estou pronto para desistir, pois o maior medo é de chegar à maturidade com essa luta perdida. Não sou de perder, definitivamente. Cometo todos os tipos de subterfúgios para sair sempre ganhando, sou assim, desde criança. Nunca hesitei neste sentido. O jeito mais suportável de perder foi por desistência, antes ou durante, pois assim, de um jeito ou de outro, tiro a glória do vencedor; não há vencedor sem competição.

Mas há competições que entramos sem perceber, e quando nos damos conta, estamos a ponto de perder tudo. Eu perdi tudo aos 19 anos, tenho perdido parte da minha juventude por um entardecer de julho em Curitiba, no pátio sombrio de um colégio, com a fina chuva tamborilando sobre nossas cabeças. É claro que tive compensações depois da perda, é claro que não fico pelos cantos chorando e trazendo à tona aquelas lembranças. Com o tempo, qualquer um é capaz de aprender a lidar com este tipo de situação. Mas isso emerge algumas vezes, foi uma grande derrota, afinal.

E agora, mais uma vez, fico diante de outro veredicto. A espera das notas dos jurados.

Não posso reclamar de Portugal; voltar ao Brasil e dizer que aqui descobri somente a origem das nossas misérias. Que descobri, ainda e apenas, que um estrangeiro não pode compartilhar do segredo de uma nação. Eles têm um segredo, que guardam muito bem; somente um português pode saber dele. Eu invejo isso, no Brasil não temos unidade alguma. Eles aprenderam a ser sozinhos no mundo, embora, vez ou outra, haja um que foge com uma mulata para alguma praia paradisíaca. Eu perdi tudo aqui, novamente, aos 21 anos. Ficarei pra sempre preso em um momento. Por coincidência, um dia chuvoso e frio, mas era abril. Ainda ouço o barulho dos trilhos da estação de São Bento, o comboio a chegar cautelosamente, a cigana a oferecer sombrinhas por 5 euros...


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